Skip to main content

Hélio Lucas ao lado de Fernando Pimenta há 18 anos

Fernando Pimenta e Joana Vasconcelos têm em comum o seu treinador, Hélio Lucas, que celebrou ao lado de Fernando Pimenta a sua centésima medalha - mais uma de ouro, conquistada este domingo. Foram sete as medalhas conquistadas pelos canoístas portugueses na Taça do Mundo de Velocidade, que se realizou no passado fim de semana, na Hungria - Joana Vasconcelos obteve a medalha de ouro na final de K1 500 metros, depois de ter conseguido o bronze nos 200 metros,  Fernando Pimenta conquistou a medalha de ouro em K1 5.000 metros, a juntar à medalha de ouro em K1 1.000 metros e à medalha de prata em K1 500 metros alcançadas no dia anterior e Norberto Mourão, na paracanoagem, venceu a medalha de Prata em VL2 200 metros e a medalha de Bronze em VL2 500 metros.

Com uma vida dedicada à modalidade, Hélio Lucas conta como rapidamente passou de atleta a treinador: "Eu fiz o ensino secundário em Desporto, na  altura e por volta do 10º ou 11º ano fui fazer uma experiência de canoagem. Fomos uma vez ao rio e, a partir dali, fiquei com um “bichinho” e quis experimentar e comecei na canoagem como atleta. Depois mais tarde, ainda muito novo, comecei a tirar o curso de Educação Física, em Vila Real, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e, já nesse ano, o nosso treinador foi deixando o clube e como eu já tinha organização uma competição para irmos, as pessoas pediram-me para ser eu a começar a organizar e a encabeçar a seção. A partir daí, tinha 17 anos ainda e comecei mais numa perspetiva do treino, de querer ajudar e iniciar a modalidade. Desde essa altura fui fazendo o percurso universitário sempre tanto na Universidade como em Ponte de Lima para tentar aprender o máximo com treinadores estrangeiros que nós tivemos e estive sempre ligado ao treino. Ou seja, praticamente a minha carreira de atleta foi uma coisa muito rápida, de dois anos apenas e eu, a partir dos 18 anos, já fui orientando as coisas no sentido do treino, que era uma coisa que eu gostava. Sempre quis seguir a área do Desporto e muito a área do treino. Depois comecei a ser um apaixonado da modalidade, passei um bocadinho por tudo, cheguei a ser diretor de clubes, fui treinador, cheguei a ser presidente de uma Associação de clubes, neste caso do Minho, de canoagem, fui vice-presidente da Federação Portuguesa de Canoagem, cheguei a ser curador nacional do Desporto Escolar, ou seja, estive em todas as áreas que têm importância na parte desportiva, de organização e mesmo na captação de jovens. Sempre ligado ao treino, numa primeiro fase na Escola Desportiva Limiana, que era um clube que tinha muitas modalidades; quando tinha 18, 19 anos fundámos o Clube de Canoagem de Ponte de Lima e a partir de 2007, mais ou menos, comecei a terminei o curso de Desporto e comecei a exercer de uma forma mais profissional e a partir daí comecei também com a carreira do Fernando e integrei a equipa nacional a partir de 2014."

Hélio Lucas trabalha lado a lado com Fernando Pimenta há 18 anos, "desde os 13 anos dele. Ele começou a sua carreira como desportista no clube, fui eu que o chamei para vir para o grupo da competição. Eu vi-o nos torneios abertos, que são aquelas provas de aprendizagem, cursos de iniciação de verão e vi que ele já era um atleta bastante determinado e com muita garra. Não era bastante coordenado e se fossemos fazer testes para escolher atletas de elite, ele ficava de fora mas as outras características que ele tinha eram bastante positivas e ele tinha muita garra, muita vontade, virava e queria voltar a entrar… Era uma pessoa muito hiperativa também e isso tudo também ajudou a superar barreiras e a melhorar ao longo dos anos", confidencia o treinador.

Numa perspetiva sobre estes anos de trabalho, revela que não têm sido fáceis mas a ambição é um fator em comum: "Têm sido anos muito trabalhosos, muito custosos porque ele tem estado já há muitos anos na excelência deste desporto. É um atleta que tem muita ambição, eu também tenho muita ambição, como em tudo gostamos de fazer o melhor e de ter resultados de excelência e é lógico que isso também nos obriga a ter uma atitude perante o treino, um trabalho muito acentuado. Ainda não tivemos um ano em que disséssemos “olha, vamos abdicar este ano de ter resultados de excelência para recuperar”, não temos essa possibilidade, portanto temos de nos ir mantendo focados cada ano em que surgem novos objetivos e novos desafios. Na alta competição sabemos que, se facilitarmos um bocadinho que seja, já podemos não estar num lugar de pódio mas estar numa final só e às vezes, para quem foi Campeão do Mundo como ele, Campeão da Europa vários anos, Medalha nos Jogos Olímpicos, ficar de fora das medalhas as pessoas vêm isso como um resultado menos positivo e já sofri isso na pele. Às vezes somos Campeões do Mundo, no ano a seguir somos 2º ou 3º e as pessoas dizem “não foi tão bom” e eu acho que, para nós, poder estar nas medalhas é um resultado excecional", considera. 

A canoagem tem tido maior visibilidade e dinâmica nos últimos anos e "é lógico que a dinâmica vem com os resultados desportivos e é isso que nos faz estar no topo. Viemos agora a uma Taça do Mundo com três atletas e regressamos como 7 medalhas. Isso é fantástico", atesta. "Ainda à pouco em conversa com o Presidente da Federação espanhola, só no sprint, que é onde eu estou ligado, eu trouxe dois atletas e eles saem com 5 medalhas, eles trouxeram 27 e saem com 8 e a Espanha, na canoagem mundial, é dos países que mais medalhas ganha. Só posso dizer que nós com muito pouco fazemos muito e isso deve-se, também, ao trabalho de todos – da Federação, dos dirigentes, do staff, de todos os treinadores, de todos os agentes da modalidade, dos clubes, é o reflexo do trabalho que nos habituamos a fazer. Não temos as condições todas – eu vim a esta prova e normalmente faço um bocadinho de tudo, até de motorista, de tudo porque não temos ainda as condições financeiras para ter um staff muito maior", desvenda Hélio Lucas.

Fernando Pimenta atingiu a marca das 100 medalhas, com a conquista da medalha de Ouro em K1 5.000 metros, na Taça do Mundo e Hélio Lucas confessa que "não tinha as contas presentes" e não esconde a satisfação e o orgulho: "Eu preocupo-me mais com os aspetos que podem ter influência direta no resultado, isso é o mais importante, porque sabemos que no momento há coisas que podem ajudar a estar mais focado, a estar mais concentrado para que nada o perturbe e esse é o meu principal foco. As contas vêm no final. Mas fico feliz, porque cada uma delas tem uma história, cada uma delas foi especial, mesmo as que não são de Ouro, as que são de Prata ou as que são de Bronze têm ali muitas horas de trabalho, muitos dias de trabalho e chego ao final e fico feliz por vê-los felizes e pelas conquistas e porque sei que trabalharam bastante para elas. Também se reflete parte da minha vida, ali, por isso é lógico que fico muito contente, muito feliz, muito orgulhoso dos feitos que o Fernando tem alcançado e agora também dos que a Joana aqui conseguiu."

Num ano atípico, marcado pela pandemia devido ao COVID-19, Hélio Lucas confirma que "foi um ano bastante difícil. Os atletas tinham objetivos na cabeça para este ano, a Joana classificar-se para os Jogos Olímpicos, o Fernando tinha objetivos de um bom resultado nos Jogos Olímpicos e de repente as coisas foram bastante controladas por muitos meses até que acabaram com o cancelamento dos Jogos Olímpicos e posteriormente foram caindo muitas provas ao longo do tempo e é lógico que isso perturbou bastante o dia a dia do nosso trabalho. Nós tentámos ao longo do ano manter-nos num sítio e continuar a fazer o nosso trabalho o melhor que podíamos e o melhor que neste caso conseguíamos, mesmo assim. Atletas como eles que trabalham o ano todo e não ter uma forma de poder explanar, se assim posso dizer, para aquilo que se prepararam, é um bocado complicado e quando vimos que havia aqui uma oportunidade de ir a esta Taça do Mundo e que ela se realizou, foi uma enorme satisfação e saímos daqui bastante contentes, porque depois de virmos aqui o ano passado e o Fernando ter ficado em 3º lugar, não ter conquistado o título de Campeão do Mundo – que era dele, em 2018 conquistou-o em Portugal – perdeu precisamente com o húngaro, passado um ano voltamos à mesma casa desse húngaro e o Fernando sai com a vitória, sinal de que fizemos um bom trabalho e que estamos na luta pelos Jogos Olímpicos."

Apesar das dificuldades causadas pela pandemia, treinador e atletas procuraram encontrar as melhores e mais seguras formas de continuar a trabalhar: "Durante muitos dias queríamos frequentar ginásios, alguns espaços que queríamos, não pudemos treinar com as pessoas que queríamos, não havia treinos em conjunto, obrigou-nos a estar muito tempo isolados e de uma forma muito individual. Mas depois, em termos gerais, cumprindo todas as regras estabelecidas pela Direção-Geral da Saúde, procurámos que os atletas tivessem quase todas as condições – e não digo que foram todas – para poderem realizar os seus treinos e lá fomos conseguindo de certa forma encontrar caminhos alternativos para que nada lhes faltasse", assegura.

Ao contrário do que aconteceu em 2020, "o próximo ano é um ano que tem muitas competições, vamos ter duas Taças do Mundo, no mês de maio, depois em junho o Campeonato da Europa, em agosto há os JO, em setembro é o Campeonato do Mundo. Ou seja, vai ser um ano em que – e estou a falar só a nível internacional – estão planeadas muitas provas", revela Hélio Lucas. "É lógico que nas condições em que estamos, estamos numa incerteza e isto é quase semana a semana. Não temos ainda planeada a próxima época porque não sabemos onde é que podemos fazer estágios, se podemos sair do país, se podemos ir para altitude se não podemos, por isso vai ser esperar e ir vendo semana a semana como é que as coisas evoluem para que tudo corra dentro da normalidade e acima deste desporto de alto rendimento e do desporto está a saúde e por isso temos de ter esses cuidados", prioriza, sem descurar a preparação para as próximas competições, nomeadamente os JO: "Nós às vezes saímos para fazer estágios em altitude noutros países, já estivemos na Colômbia, já estivemos no México, outras vezes vamos para Espanha, fazer alguns treinos em conjunto com outras equipas e tenho ideias de ir mas tenho de fazer dois planos – um plano mais “caseiro”, se podemos assim dizer, caso as coisas se mantenham assim e um plano normal, se por acaso se conseguir sair do país, se conseguir viajar e que estejam reunidas as condições de segurança para os atletas e para a saúde deles, só aí é que nós vamos viajar e fazer 100% aquilo que tínhamos planeado. Caso contrário, vou arranjar um plano alternativo", garante o próprio.